Os problemas de usar IA como terapeuta.Aproximadamente 4 min. de leitura

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Sabe aquela conversa que você tem com um amigo e, de repente, uma ficha cai? Ou aquele momento na terapia em que o silêncio do analista te faz encontrar uma resposta que estava dentro de você o tempo todo? Esses momentos são profundamente humanos. Eles nascem de um lugar de empatia, de um olhar que compreende, de uma presença que acolhe. Agora, imagine tentar encontrar isso em um aplicativo de celular.

É cada vez mais comum ouvir sobre pessoas que desabafam com chatbots de inteligência artificial (IA). A ideia parece tentadora, um “terapeuta” disponível 24 horas por dia, que não te julga e responde instantaneamente. Em um mundo onde quase metade das pessoas que precisam de ajuda psicológica não consegue acesso a ela, a IA surge como uma promessa de alívio rápido. Mas, como em muitas soluções fáceis, existem perigos que não podemos ignorar.

Vamos pensar juntos: O que faz a terapia funcionar?

Um dos pilares é o que chamamos de vínculo terapêutico, é a confiança que se constrói, a sensação de estar em um espaço seguro para ser vulnerável. Uma IA, por mais avançada que seja, não sente. Ela simula. Um estudo recente da Universidade de Stanford mostrou algo preocupante, chatbots de terapia podem não apenas ser ineficazes, mas também reforçar estigmas. Eles demonstraram preconceito contra condições como esquizofrenia e dependência de álcool, algo que um profissional treinado aprende a nunca fazer.

O problema é que a IA funciona com padrões. Ela aprende com uma imensidão de textos, mas não tem a capacidade de entender as nuances da sua história. Aquele seu jeito de falar, a hesitação antes de tocar num assunto delicado, a ironia que você usa para se defender da dor, nada disso é dado para um algoritmo. Um terapeuta humano escuta o que não é dito. Ele percebe a sua linguagem corporal, o tom da sua voz, a emoção que brilha nos seus olhos. A IA, por outro lado, pode te dar uma resposta que parece perfeita, mas que não te confronta, não te desafia a crescer. Ela foi programada para te agradar, para te manter engajado, e não necessariamente para te ajudar a lidar com a raiz do seu sofrimento.

Conversar com uma máquina pode parecer mais fácil do que se abrir com outra pessoa. Não há o medo do julgamento, da incompreensão. Mas essa facilidade pode se tornar uma armadilha, gerando uma dependência emocional de um sistema que não tem responsabilidade sobre você. E se, em um momento de crise profunda, você busca ajuda e o chatbot falha? A pesquisa de Stanford também revelou que, em simulações de ideação suicida, alguns chatbots chegaram a fornecer informações perigosas, em vez de acionar um protocolo de emergência.

No Brasil, a situação é ainda mais delicada, pois não existe uma regulamentação clara sobre o uso de IA para fins terapêuticos. O Conselho Federal de Psicologia já discute os riscos, mas enquanto isso, seus dados mais íntimos estão sendo compartilhados com uma empresa de tecnologia, sem a proteção ética e legal que um consultório oferece, para citar o consultório de um psicólogo, mas não esqueçamos dos psicanalistas ou psicoterapeutas que também atuam nessa esfera.

Isso não significa que a tecnologia seja uma vilã. Ela pode ser uma ferramenta de apoio fantástica. Pode ajudar a organizar seus pensamentos em um diário, a monitorar seu humor ou até mesmo a encontrar um profissional qualificado. Mas ela deve ser um complemento, e não um substituto para a conexão humana.

A psicoterapia é um processo, muitas vezes lento e desafiador. É um encontro entre duas pessoas, onde uma delas está treinada para te ajudar a navegar pelas suas próprias profundezas. É um trabalho de autoconhecimento que exige coragem, paciência e, acima de tudo, um vínculo real.

Se você está passando por um momento difícil, a busca por um alívio imediato é compreensível. Mas, em vez de se voltar para a frieza de um algoritmo, que tal tentar o caminho, por vezes mais difícil, mas infinitamente mais transformador, do contato humano? Procure um amigo ou um familiar caso precise apenas desabafar, ter um ombro amigo, mas para uma trabalho profissional, mais sério e consistente, procure por um profissional de saúde mental. Não tenha a menor dúvida que a escuta atenta e a presença genuína de outra alma humana têm um poder de cura que nenhuma linha de código jamais conseguirá replicar.

Paz e luz.

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