Sincronicidade ou coincidência? Entendendo os sinais que a vida te envia.Aproximadamente 5 min. de leitura

Leia o artigo

Foi só coincidência? Quem nunca se pegou repetindo essa pergunta, no mínimo intrigado, ao ver uma sequência de acontecimentos que parecem conversar entre si? A resposta que ofereço aqui não é simplista, ela valida a sua intuição, que algo ali pode ter significado, e ao mesmo tempo traça uma linha clara entre acaso estatístico e aquilo que Jung1 chamou de sincronicidade.

Carl Gustav Jung cunhou o termo sincronicidade para falar de coincidências que são psicologicamente significativas, isto é, quando um fato exterior parece refletir, complementar ou responder a um estado interior, sem haver uma causa direta entre os dois eventos. Jung não dizia que tudo é mágico, dizia que, em certas condições, conexões não-causais podem carregar sentido para quem as vive.

Uma coincidência é, do ponto de vista estatístico, a justaposição de eventos sem relação causal aparente, algo que acontece, por puro acaso. Já a sincronicidade é quando essa justaposição toca uma corda interna do sujeito, o encontro torna-se “significativo” porque ressoa com uma imagem, um sonho, uma decisão ou uma crise pessoal. Em termos práticos, coincidências acontecem o tempo todo, sincronias acontecem quando o ponto de contato ilumina algo na nossa vida.

Jung desenvolveu a ideia ao longo de décadas e partilhou reflexões com o físico Wolfgang Pauli, uma interlocução famosa que acabou em publicações conjuntas explorando essa ponte entre mente e mundo exterior. Esse diálogo ajudou Jung a formular a noção de uma “conexão acausal” que não se explicaria apenas por relações de causa e efeito.

Você tem um sonho muito simbólico sobre um animal e, no dia seguinte, encontra esse animal de forma inesperada, não por coincidência trivial, mas porque a imagem do sonho estava ligada a uma questão emocional viva.

Durante uma transição importante (luto, mudança de emprego, decisão de vida) aparecem sinais repetidos, tais como uma música na rádio, um número, um encontro fortuito que parece “apontar” algo.

Jung relatou vários casos clínicos onde pacientes viveram episódios assim, o exemplo clássico é o da paciente que sonhou com um besouro e, no consultório, um besouro bateu na janela, momento que permitiu avançar no processo terapêutico.

E na terapia? Serve para algo?

Sim, e com limites. Pesquisas com clínicos mostram que muitos terapeutas já vivem ou testemunham experiências sincronísticas em consultório, eu mesmo tive um evento em que durante uma consulta uma abelha entrava no consultório, eu abria a janela e a colocava para fora para no instante seguinte ela entrar novamente, isso se repetiu algumas vezes, essa “insistência me chamou a atenção e peguei um dicionário de símbolos na hora e li o significado que estava relacionado diretamente com o processo da cliente que revelaram questões que ela ainda não tinha exposto, ao pegar o dicionário a “insistência da abelha” parou.

Um estudo com uma amostra de profissionais relatou que uma proporção significativa (cerca de 44% na amostra citada) já havia percebido sincronias no processo terapêutico, e dois terços consideraram essas experiências potencialmente úteis quando trabalhadas com cuidado, ou seja, quando reconhecidas e interpretadas com profissionalismo, sincronias podem abrir caminhos simbólicos que ajudam a consciência a se reorganizar.

É importante ressaltar que há explicações racionais (probabilidade, viés de confirmação, expectativa seletiva) que mostram como nossa mente tende a dar sentido ao acaso, e a ciência costuma ser cética sobre qualquer explicação que não seja testável. Jung mesmo reconheceu limites e advertiu contra superstições. Em resumo, acolher o sentido de uma sincronicidade não significa abandonar o pensamento crítico, a maioria das coisas que observamos não são sincronicidades.

Como saber o que fazer quando algo parece sincronístico?

Pare e registre, descreva o que aconteceu e como você estava internamente observando emoções, pensamentos, sonhos.

Pergunte sem pânico o que esse sinal pode estar me chamando a olhar?

Procure sentido na ação, não na etiqueta, a utilidade vem quando a experiência gera uma atitude transformadora como um insight, uma conversa difícil ou uma mudança prática.

Se for muito intenso ou desestabilizador, peça ajuda, excesso de “sinais” ou interpretações que isolam você do mundo comum podem ser sintoma de confusão significativa, e aí, a supervisão clínica ou avaliação psiquiátrica é prudente.

Não é preciso escolher entre “tudo é destino” ou “tudo é sorte”. Existe, legitimamente, um espaço intermediário, a nossa capacidade de encontrar e responder a sentidos, quer as coincidências sejam explicadas pela estatística ou por uma dimensão mais simbólica. Jung ofereceu uma forma respeitosa de dizer que o mundo pode falar com a nossa interioridade, a ciência nos lembra de separar aquilo que ajuda daquilo que nos ilude, ou seja, quando a sua intuição sussurra “isso parece significar algo”, vale a pena escutar, mas mantenha os pés no chão e olhos atentos.

Paz e luz.

 

1 – Carl Gustav Jung (1875-1961): Psiquiatra suíço e fundador da Psicologia Analítica. Jung expandiu a compreensão do inconsciente, introduzindo conceitos como arquétipos e o inconsciente coletivo, e enfatizou a importância dos símbolos e da jornada individual de autoconhecimento.

Autor

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *