A Síndrome do Impostor e a voz do crítico interno: como diferenciar a autocrítica da autotortura.Aproximadamente 5 min. de leitura

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Quem nunca se viu diante de uma conquista, um reconhecimento, e sentiu aquela pontinha de dúvida? Aquela voz que sussurra: “Será que eu realmente mereço isso?” ou “E se descobrirem que não sou tão bom quanto pensam?”. Essa sensação, que nos faz questionar nossas próprias capacidades e méritos, é o que muitos conhecem como a Síndrome do Impostor.

Não se trata de uma doença ou um transtorno mental no sentido clínico, mas sim de um padrão psicológico persistente. Pessoas que experimentam a Síndrome do Impostor, apesar de evidências externas de sucesso e competência, vivem com um medo constante de serem desmascaradas como fraudes. Elas atribuem suas conquistas à sorte, ao acaso, ou à capacidade de enganar os outros, minimizando o próprio esforço e talento. É um fardo pesado, que impede de desfrutar plenamente das vitórias e gera um ciclo vicioso de ansiedade e autoexigência.

No cerne da Síndrome do Impostor, e de muitas outras inseguranças que carregamos, está a voz do crítico interno. Mas o que é essa voz? Pense nela como um narrador constante em nossa mente, que comenta sobre nossas ações, pensamentos e até mesmo sobre quem somos. Em sua versão mais saudável, o crítico interno é a nossa capacidade de autocrítica, fundamental para o aprendizado, o crescimento e a melhoria contínua. É aquela parte de nós que nos ajuda a identificar erros, a buscar aprimoramento e a manter os pés no chão.

No entanto, quando essa voz se torna excessivamente dura, implacável e desproporcional, ela se transforma em um verdadeiro carrasco. É quando a autocrítica saudável dá lugar à autotortura. O crítico interno patológico distorce a realidade, amplifica falhas, minimiza sucessos e nos paralisa com o medo do julgamento, seja ele externo ou, principalmente, interno. Ele nos diz que não somos bons o suficiente, que vamos falhar, que não merecemos o amor ou o sucesso. Essa voz pode ser tão convincente que passamos a acreditar nela como uma verdade absoluta.

A origem do crítico interno é complexa e multifacetada, mas a psicanálise nos oferece algumas lentes para compreendê-la. Muitas vezes, essa voz é internalizada a partir de experiências da infância. Pais, professores ou figuras de autoridade que foram excessivamente críticos, exigentes ou que transmitiram a mensagem de que o amor e a aceitação estavam condicionados ao desempenho, podem ter contribuído para a formação de um superego (a instância psíquica que representa a moral e os ideais) punitivo e severo. Traumas, experiências de fracasso ou humilhação também podem fortalecer essa voz, que passa a nos proteger (de forma distorcida) de futuras dores, nos mantendo em uma zona de segurança aparente, mas limitante.

A chave para lidar com o crítico interno não é silenciá-lo completamente, afinal, ele tem sua função, mas sim aprender a discernir quando ele está sendo um guia útil e quando está se tornando um sabotador. Aqui, a escuta atenta e a auto-observação são ferramentas poderosas. Pergunte-se:

  • A mensagem é construtiva? A crítica aponta para um erro específico e sugere um caminho de melhoria, ou é uma condenação generalizada da sua pessoa?
  • O tom é acolhedor ou punitivo? A voz é calma e encorajadora, mesmo ao apontar uma falha, ou é agressiva e desqualificadora?
  • Qual a emoção que ela gera? A autocrítica saudável pode gerar um desconforto temporário, mas também um senso de motivação. A autotortura, por outro lado, costuma gerar ansiedade, vergonha, culpa paralisante e desesperança.
  • Ela me impulsiona ou me paralisa? Uma crítica construtiva nos move à ação. A autotortura nos congela, nos faz duvidar de tudo e nos impede de tentar.

Reconhecer a voz do crítico interno é o primeiro passo. O segundo é desarmá-lo, não com confronto, mas com compreensão e compaixão. Não se trata de ignorar suas falhas, mas de abordá-las com gentileza e realismo.

Aqui estão algumas estratégias:

  • Nomeie a voz: Dar um nome ao seu crítico interno pode ajudar a criar uma distância. Ele não é você, é uma parte de você. “Ah, lá vem o ‘Exigente’ de novo.”
  • Questione a narrativa: O crítico interno costuma operar com verdades absolutas e distorcidas. Desafie essas crenças. “Isso é realmente verdade? Há outras formas de ver essa situação?”. Busque evidências, tanto para o sucesso quanto para o fracasso, de forma objetiva.
  • Pratique a autocompaixão: Trate-se com a mesma gentileza e compreensão que você trataria um amigo. Reconheça que errar faz parte do processo humano e que você é digno de bondade, mesmo com suas imperfeições.
  • Foque no processo, não apenas no resultado: A Síndrome do Impostor e o crítico interno muitas vezes se fixam no resultado final. Celebre o esforço, o aprendizado e a coragem de tentar, independentemente do desfecho.
  • Busque apoio: Conversar com um psicanalista pode ser fundamental para desvendar as raízes dessa voz e construir um diálogo interno mais saudável. Um profissional pode ajudar a identificar padrões, ressignificar experiências passadas e fortalecer sua autoestima.

A Síndrome do Impostor e a voz do crítico interno são desafios comuns na jornada humana. Entendê-los, diferenciar a autocrítica construtiva da autotortura e cultivar um diálogo interno mais compassivo e realista são passos essenciais para viver uma vida mais plena, autêntica e livre do peso da autoexigência excessiva. Lembre-se: você não precisa ser perfeito para ser digno de suas conquistas e de sua própria bondade.

Paz e luz.

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